Resumo
Para colaborar com a compreensão e fundamentação do porquê dos dentes endodonticamente tratados poderem ser movimentados ortodonticamente, discorremos sobre o assunto dividindo-o em três tópicos: 1) dentes endodonticamente tratados sem lesão periapical; 2) dentes endodonticamente tratados com lesão periapical inflamatória; e 3) dentes endodonticamente tratados com necrose pulpar asséptica por traumatismo dentário. Ressalta-se que todos os dentes endodonticamente tratados a serem movimentados ortodonticamente devem ser submetidos a uma avaliação criteriosa sobre as condições adequadas ou inadequadas do tratamento endodôntico por parte do endodontista. Nos casos de insucesso, deve-se considerar que as forças ortodônticas não modificaram a composição e a virulência da microbiota envolvida. Os insucessos endodônticos nesses casos devem ser atribuídos às mesmas causas dos insucessos que envolvam dentes com tratamento endodônticos e que nunca foram movimentados ortodonticamente.
Palavras-chave: Ortodontia. Endodontia. Tratamento endodôntico. Tratamento ortodôntico. Periapicopatias. Traumatismo dentário.
Introdução
Muitas decisões clínicas ainda se baseiam em experiências pessoais e na extrapolação de conhecimentos de áreas básicas e correlatas. Isso ocorre por falta de pesquisas específicas sobre um determinado assunto. Algumas das perguntas mais frequentes na prática ortodôntica são: O dente foi submetido a tratamento endodôntico; quando posso iniciar sua movimentação ortodôntica? Quando há lesão periapical, alguma coisa muda? A necrose pulpar foi asséptica por traumatismo dentário, posso desconsiderar esse detalhe?
Para contribuir com a compreensão e fundamentação das decisões clínicas necessárias e inadiáveis sobre movimentar ou não dentes endodonticamente tratados, abordaremos o assunto à luz da inter-relação de experiências clínicas e laboratoriais obtidas ao longo do tempo, associadas aos conhecimentos sobre inflamação, reparo tecidual, biologia da movimentação dentária e das reabsorções associadas, pulpopatias e periapicopatias.
É importante ressaltar que, em praticamente todas as situações, os dentes, endodonticamente tratados, a serem movimentados ortodonticamente devem ser submetidos a uma avaliação criteriosa sobre as condições adequadas ou inadequadas do tratamento endodôntico, por parte de um endodontista. Em casos em que essa condições forem consideradas inadequadas ou impróprias por esse profissional, um retratamento endodôntico deve ser realizado.
1) Movimentação ortodôntica de dentes endodonticamente tratados e sem lesão periapical
O tratamento endodôntico não aumenta e nem diminui a possibilidade reabsorções radiculares induzidas pelo tratamento ortodôntico, como revelaram Spurrier et al.4
Houve uma redução acentuada de tratamentos endodônticos, decorrente da diminuição de cáries, e um aumento considerável dos tratamentos por necrose pulpar decorrente do traumatismo dentário. Esse aumento, ao longo das duas últimas décadas, deu-se pelas várias formas e pela maior oportunidade de se praticar lazer e esportes, assim como pela maior mobilidade a que nos submetemos — com maiores chances de acidentes, especialmente nas grandes cidades.
O fenômeno do movimento ortodôntico se dá no ligamento periodontal2, sem qualquer participação ativa, direta ou indireta, da polpa dentária. Os cementoblastos não têm receptores para os mediadores do turnover ósseo, mas os osteoblastos, localizados a 0,25mm do dente, os têm. Essa propriedade dos cementoblastos permite que os dentes sejam movimentados graças à reabsorção óssea, sem comprometer as estruturas radiculares.
A aplicação de força ortodôntica comprime as células periodontais, deformando seus citoesqueletos, promovendo um estresse mecânico e, ao mesmo tempo, metabólico, pois também diminui os lumes dos vasos sanguíneos, com consequente hipóxia na área. As células estressadas do ligamento periodontal liberam muitos mediadores que estimulam, alternadamente, a reabsorção e a aposição óssea no processo alveolar, promovendo uma remodelação óssea local, fixando o dente em uma nova posição.
A reabsorção radicular, induzida durante o tratamento ortodôntico, ocorrerá se as forças aplicadas provocarem a morte de cementoblastos, com subsequente exposição da superfície radicular. A morte dos cementoblastos está, necessariamente, associada a forças mais intensas que comprimem os vasos em determinadas áreas do ligamento periodontal.
Os tecidos pulpares não apresentam alterações morfológicas e funcionais durante a movimentação ortodôntica1,3, independentemente do tipo e intensidade de força aplicada. Assim, se o canal estiver preenchido por material endodôntico em lugar da polpa, não ocorrerá qualquer modificação nos tecidos periodontais com o movimento ortodôntico. Se um dente endodonticamente tratado for movimentado ortodonticamente e apresentar-se com menos ou mais reabsorções radiculares, essas não estarão relacionadas com o presente tratamento endodôntico.
O que pode vir a acontecer?
Reativação de lesões periapicais anteriores: as reabsorções apicais decorrentes das forças aplicadas podem “reabrir” canalículos, túbulos e canais acessórios — ainda com componentes bacterianos. Isso pode promover temporariamente a reinstalação de lesões periapicais crônicas, como pericementite apical crônica e/ou granuloma periapical.
Nessas condições, a microbiota local tem limitações patogênicas, haja vista que, pela falta de comunicação com o meio bucal, não há fonte nutricional para uma exuberante proliferação microbiana. Uma vez cessado o tratamento ortodôntico, o processo reativado tende, por si só, a regredir. Se não acontecer a regressão, o dente deve ser retratado endodonticamente. Essa situação é muito rara, teoricamente ocorrendo muito esporadicamente.
Pseudossobreobturação: as reabsorções apicais decorrentes das forças aplicadas arredondam e encurtam o dente, mas os cones de guta-percha e alguns cimentos obturadores não são fagocitados pelos macrófagos e/ou pelos clastos. Depois de concluído o tratamento ortodôntico, a aparência do dente endodonticamente tratado e reabsorvido em função da movimentação ortodôntica será de um cone de guta-percha, ultrapassando o limite mais apical do dente2. Essa situação é relativamente comum em dentes endodonticamente tratados e movimentados.
O tempo de espera e explicações relacionadas
Se, do ponto de vista morfológico, o movimento ortodôntico não altera a biologia da polpa e nem a envelhece, da mesma forma o tratamento endodôntico em nada interfere nos fenômenos celulares e teciduais da movimentação dentária.
A rigor, do ponto de vista biológico — correlacionando os conhecimentos a respeito da biologia pulpar e do movimento ortodôntico —, a aplicação de forças pode ser feita depois de alguns dias da realização do tratamento endodôntico. Entre 15 e 30 dias, o exsudato (líquidos) e o infiltrado inflamatório (células) foram absorvidos e migraram do local. Depois de quinze dias, um tecido de granulação maduro está em fase avançada de reconstrução do ligamento periodontal.
Aos casos de movimentação ortodôntica de dentes endodonticamente tratados em que se detectou insucesso ao longo dos meses ou anos, não se deve atribuir tal insucesso à movimentação dentária efetuada. As forças aplicadas não interferem na patogenicidade e na virulência da microbiota associada, assim como na biologia dos biofilmes microbianos e lesões periapicais inflamatórias crônicas. O insucesso deve ser justificado a partir das limitações inerentes ao próprio tratamento endodôntico.
2) Movimentação ortodôntica em dentes endodonticamente tratados com lesão periapical inflamatória
As lesões periapicais — também conhecidas como periapicopatias — são predominantemente inflamatórias; todavia, há duas periapicopatias não inflamatórias:
1) Displasia cemento-óssea periapical: uma lesão fibro-óssea displásica periapical dos incisivos inferiores que requer diagnóstico seguro e acompanhamento, sem qualquer tratamento ou consequência para o paciente.
2) Cementoblastoma benigno: uma neoplasia odontogênica quase que exclusiva do periápice dos primeiros molares inferiores. Deve ser removido cirurgicamente, com um bom prognóstico.
As periapicopatias inflamatórias podem estar associadas:
1) a uma microbiota mista, presente nos canais em que a polpa dentária necrosou por cárie e pulpites decorrentes; ou, ainda,
2) à necrose pulpar asséptica, decorrente de traumatismo dentário.
Toda lesão periapical inflamatória se inicia como pericementite apical aguda, podendo evoluir para:
1) abscesso dentoalveolar agudo e, depois, crônico, caracterizado pela fístula;
2) pericementite apical crônica e, depois, granuloma periapical; podendo assim permanecer por meses ou anos, eventualmente evoluindo para cisto periodontal apical.
No caso das periapicopatias inflamatórias agudas — pericementite aguda e abscesso dentoalveolar em suas várias fases —, o tratamento endodôntico tem um excelente prognóstico se considerarmos que não se tem tempo e nem condições locais para ocorrer reabsorções apicais. As bactérias terão um tempo menor de colonização e superfícies radiculares mais regulares, o que dificulta sua permanência na estrutura radicular depois do tratamento endodôntico adequado.
Nas periapicopatias inflamatórias crônicas (pericementite apical crônica e granuloma periapical), o tempo de permanência da microbiota é muito maior do que nas agudas, permitindo que bactérias colonizem os túbulos dentinários e ás áreas irregulares, quase sempre presentes por reabsorções apicais. Ao mesmo tempo, as bactérias formam biofilmes microbianos na superfície externa da raiz.
Essas condições permitem um bom prognóstico para as periapicopatias crônicas — mas com reservas, pois a técnica endodôntica, por mais evoluída que seja, ainda não assegura a completa eliminação desse componente microbiano. A taxa percentual de insucesso em casos de tratamento endodôntico de dentes com lesão periapical crônica varia de 10 a 35%, conforme a casuística analisada.
O granuloma periapical é constituído por um aglomerado mais ou menos organizado de células inflamatórias, especialmente macrófagos, linfócitos e plasmócitos. Essas células são nutridas por numerosos vasos, sendo fisicamente suportadas pelo exsudato e por uma matriz extracelular com fibroblastos e fibras colágenas eventuais. Por analogia, pode-se comparar o granuloma periapical a uma almofada de tecido mole, acomodada e envolvendo a parte mais apical da raiz dentária.
O termo periapicopatia inflamatória crônica quase sempre está relacionado ao granuloma periapical, pois cistos periodontais apicais — pequenos ou médios — estão em um contexto de granuloma periapical. Nesses casos, o exclusivo tratamento endodôntico se mostra eficiente.
O que mantém o granuloma periapical ativo é a constante saída de produtos bacterianos e das próprias bactérias para a região periapical, especialmente no canal cementário. A eliminação da fonte microbiana pelo tratamento endodôntico adequado implica em eliminar o estímulo. Imediatamente após o tratamento endodôntico, em algumas horas, os macrófagos e demais células do granuloma periapical eliminam as últimas bactérias e seus produtos. Também faziam isso antes, mas a saída de bactérias era constante.
Em algumas horas, ou em poucos dias, o granuloma periapical vai cedendo lugar a um tecido livre de bactérias e de seus produtos, graças à atividade macrofágica. O espaço do granuloma periapical passa a ser ocupado por um tecido de granulação rico em vasos, com invasão de células osteoblásticas visando o reparo ósseo, levando à deposição inicial do osso primário.
O reparo se inicia dentro de algumas horas, assim que eliminados os agentes microbianos. No entanto, o reparo ósseo local vai demorar para gerar uma imagem radiográfica periapical normal. A geração dessas imagens depende de um maior grau de maturidade tecidual e de densidade mineral do tecido ósseo neoformado, o que pode demorar de semanas até alguns meses.
O que pode vir a acontecer?
Além da pseudossobreobturação no final do tratamento ortodôntico — como mencionado no tópico anterior —, outras consequências independem da movimentação ortodôntica, como, por exemplo, a persistência da lesão ou sua regressão parcial, ou até seu crescimento.
Nos casos de insucesso de regressão da periapicopatia, deve-se avaliar o tratamento endodôntico quanto à eliminação completa da microbiota, dos espaços por ela ocupada e, ainda, a possibilidade do dente envolvido ser portador de morfologia diferente (como delta apical, dilacerações, sulcos do desenvolvimento, etc.), o que dificultaria a eliminação da microbiota pelo tratamento endodôntico. Não parece pertinente atribuir o insucesso ao fato do dente ter sido movimentado ortodonticamente. As forças não mudam a composição nem a patogenicidade de uma microbiota.
O tempo de espera e explicações relacionadas
As forças ortodônticas aplicadas sobre um determinado tecido não modificam, nem potencializam, a ação de microbiotas instaladas em lesões periapicais crônicas de dentes endodonticamente tratados; igualmente, também não influenciam no reparo dessas.
Mas as forças não comprimiriam os vasos da região em reparo, dificultando a proliferação celular e a síntese de novos componentes teciduais? Não! Pois o ápice está envolvido e a região periapical preenchida por um tecido mole do antigo granuloma periapical, ou até mesmo do tecido de granulação do reparo em andamento. Não há como a aplicação de forças nesse local comprimir vasos; as paredes não são duras e nem são limitadas por um espaço periodontal de 0,25mm. Na realidade, existe uma extensa área de tecido mole em reconstrução. A força necessária para comprimir uma estrutura frágil como o ligamento periodontal não teria efeito sobre um tecido mole em uma área mais ampla, como a do reparo em área anteriormente ocupada por uma lesão periapical crônica.
Do ponto de vista biológico, pelo que se conhece e se concebe como força ortodôntica, não há como ela interferir no reparo de lesões periapicais crônicas depois de um adequado tratamento endodôntico. A rigor, a movimentação de um dente com lesão periapical crônica tratada endodonticamente pode ser feita após alguns dias. Um tempo entre 15 e 30 dias seria mais do que suficiente para o exsudato e o infiltrado inflamatório serem, respectivamente, absorvido e migrado do local, permanecendo apenas os macrófagos e outras células que estivessem participando do tecido de granulação no reparo da área.
Em casos de movimentação ortodôntica de dentes endodonticamente tratados, nos quais se detectou insucesso ao longo dos meses ou anos, não se deve atribuir esse fato à movimentação dentária efetuada. As forças aplicadas não interferem na patogenicidade e na virulência da microbiota associada, e nem na biologia dos biofilmes microbianos e lesões periapicais inflamatórias crônicas.
Nesses casos, o insucesso deve ser justificado a partir das limitações inerentes ao próprio tratamento endodôntico, não ao fato do dente ter sido submetido à movimentação ortodôntica. Em dentes com lesões periapicais crônicas, a frequência de áreas irregulares decorrentes das reabsorções apicais é muito grande, aumentando a possibilidade de persistência de biofilme microbiano.
A ocorrência de falhas no fechamento hermético da abertura apical em função de irregularidades anatômicas naturais, assim como a presença de deltas apicais, o material utilizado e muitos outros fatores que influenciam no resultado final, também podem justificar esses insucessos endodônticos. A possibilidade de insucesso em dentes endodonticamente tratados com lesão periapical crônica é maior do que nas demais situações.
3) Movimentação ortodôntica em dentes endodonticamente tratados com necrose pulpar asséptica por traumatismo dentário
A necrose pulpar asséptica pode ser tratada logo depois de sua ocorrência, mas também pode ser clinicamente ignorada, vindo a ser detectada pelo escurecimento coronário ou por meio de exames radiográficos de rotina — como os realizados no planejamento ortodôntico —, e apenas depois de meses ou de anos. Quando diagnosticada depois de muito tempo, o dente acometido poderá apresentar pericementite apical crônica e/ou até mesmo granuloma periapical de pequeno tamanho.
Depois de um ano, metade das necroses pulpares assépticas tende a apresentar microbiota por invasão hematogênica do canal radicular por via retrógrada. Em geral, trata-se de uma microbiota de baixa agressividade e com pouca atividade metabólica, haja vista que os dentes envolvidos não se apresentam com envolvimento periodontal, nem há exposição dentinária ou pulpar ao meio bucal.
Com relação à movimentação ortodôntica, o mesmo comportamento esperado para os dentes tratados endodonticamente de necrose pulpar com canais infectados é esperado para os dentes tratados endodonticamente por necrose pulpar asséptica decorrente de traumatismo dentário, com ou sem lesão periapical. No entanto, essa situação de necrose asséptica deve ser encarada de forma diferente, pela seguinte regra: todo dente previamente traumatizado, se movimentado, pode apresentar reabsorções radiculares mais precoces e de maior intensidade ao final do tratamento ortodôntico.
Essa regra independe do dente ter sido ou não endodonticamente tratado de necrose asséptica. No traumatismo dentário, há maior chance do reparo da camada cementoblástica (focalmente, em pontos eventuais) ser feito com células da linhagem osteoblástica que tenham receptores para os mediadores do turnover ósseo. Nos traumatismos dentários, as lesões da camada cementoblástica são bem mais extensas do que aquelas induzidas no tratamento ortodôntico.
Os mediadores, apesar dos osteoblastos se comportarem morfológica e fisiologicamente como cementoblastos ou cementoblastos-like, levam — com seu acúmulo habitual no ligamento, pela compressão das forças ortodônticas — à reabsorção óssea periodontal, como esperado; mas também levam à reabsorção da raiz, que em condições normais é protegida pelos cementoblastos verdadeiros, sem receptores para tais mediadores. Isso ocorre porque os cementoblastos-like — verdadeiros osteoblastos — assumem o gerenciamento de unidades osteorremodeladoras depois de algumas horas da aplicação da força, reabsorvendo a raiz.
Os dentes traumatizados, sem ou com necrose pulpar asséptica, mas com tratamento endodôntico adequado, podem ser movimentados ortodonticamente, mas o profissional deve dimensionar bem as forças, distribuindo-as uniformemente ao máximo possível na estrutura dentária, realizando controle radiográfico periapical a cada três meses para verificar o grau de reabsorção radicular, caso esteja ocorrendo. Dentro do possível, esses dentes não devem ser usados como ponto de ancoragem e ser submetidos a movimentos extensos e a mecânicas intrusivas. Se não houver outra opção, podem ser usados, mas previsivelmente apresentarão maior grau de reabsorção radicular.
O que pode vir a acontecer?
Os inconvenientes da movimentação ortodôntica de dentes endodonticamente tratados de necrose pulpar asséptica decorrente do traumatismo dentário estão relacionados, principalmente, com o fato do dente ter sido traumatizado previamente ao tratamento. As reabsorções radiculares podem ser maiores ao final do tratamento ortodôntico. Quanto ao fato do dente ter sido tratado endodonticamente, não há qualquer contraindicação, principalmente porque refere-se a um dente com necrose pulpar asséptica que, quando contaminado secundariamente por via hematogênica e retrógrada, possui microbiota de baixa virulência.
O tempo de espera e explicações relacionadas
Todo dente previamente traumatizado, se movimentado, pode apresentar reabsorções radiculares mais precoces e de maior intensidade ao final do tratamento ortodôntico. Essa possibilidade justifica a regra de esperar algum tempo para que esse tipo de dente seja submetido ao movimento ortodôntico, sendo essa regra quase que universalmente aceita e seguida2. Esse tempo varia conforme a classificação do traumatismo (leve, moderado ou severo).
Em traumatismos leves — como a concussão e subluxação discreta —, deve-se esperar de 3 a 4 meses para providenciar uma nova radiografia periapical ou tomografia, e avaliar se os tecidos e estruturas periodontais voltaram ao normal. Fazendo assim, pode-se movimentar o dente.
Em traumatismos dentários moderados, caracterizados por subluxação mais severa, luxação, deslocamentos e até por extrusão sem avulsão total do dente do alvéolo, deve-se esperar um ano. Se novas radiografias periapicais e/ou tomografias depois desse período revelarem normalidade estrutural e organizacional, ausência de anquilose alveolodentária, reabsorção por substituição e/ou reabsorção inflamatória, o dente pode ser movimentado ortodonticamente.
Nos casos mais severos, como de avulsão total seguida de reimplantação após até 30 a 60 minutos fora do alvéolo, e em casos de fraturas radiculares, deve-se aguardar dois anos. Após esse período, se novas radiografias periapicais e/ou tomografia revelarem normalidade estrutural e organizacional, sem anquilose alveolodentária, sem reabsorção por substituição e sem reabsorção inflamatória, o dente pode ser movimentado ortodonticamente. É importante sempre relembrar a seguinte regra: poderão ocorrer maiores reabsorções radiculares ao final do tratamento ortodôntico, devido o trauma prévio ao tratamento.
Considerações finais
Os dentes endodonticamente tratados podem ser movimentados ortodonticamente; mas, nos casos de insucesso, deve-se considerar que as forças ortodônticas não modificaram a composição e a virulência da microbiota envolvida. Nesses casos, os insucessos endodônticos devem ser atribuídos às mesmas causas de insucessos endodônticos de dentes que nunca foram movimentados ortodonticamente. Se o dente for movimentado ortodonticamente, a história de traumatismo prévio ao tratamento aumenta a probabilidade de reabsorções radiculares mais severas — e isso não deve ser atribuído ao fato do dente ter sido endodonticamente tratado de necrose pulpar asséptica.
Como citar este artigo: Consolaro A, Consolaro RB. Fez a endodontia: E agora? Quando movimentar? Fundamentos biológicos. Rev Clín Ortod Dental Press. 2013 jun-jul;12(3):123-8.